CARTA ABERTA AOS MINISTROS DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE E MUDANÇA DO CLIMA E DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E AGRICULTURA FAMILIAR
Brasília, 29 de abril de 2025
Excelentíssimos(as) Ministros(as) Marina Silva e Paulo Teixeira,
As organizações da sociedade civil, os representantes de povos e comunidades tradicionais (PCTs) e demais entidades signatárias desta carta vêm, por meio deste manifesto, expressar sua profunda preocupação com os entraves e a morosidade no avanço do processo de construção e aprovação de um normativo federal para o reconhecimento e regularização fundiária dos territórios tradicionais.
Após mais de uma década de debates, consultas, acúmulos técnicos e mobilizações sociais em torno da necessidade de um marco normativo específico para os territórios dos PCTs — que não se confundem com os procedimentos voltados a indígenas e quilombolas — conforme previsto no art. 231 da Constituição Federal e regulamentado pelo Decreto nº 1.775/1996, no caso dos povos indígenas, e no art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), regulamentado pelo Decreto nº 4.887/2003, no caso das comunidades quilombolas, é inaceitável que ainda não haja uma regulamentação efetiva que reconheça a legitimidade e assegure a proteção dos territórios ocupados tradicionalmente por comunidades de terreiro, povos ciganos, pescadores artesanais, ribeirinhos, extrativistas, caiçaras, povos de matriz africana, pantaneiros, quebradeiras de coco babaçu, açorianos, faxinalenses, fundos e fechos de pasto, geraizeiros, ilhéus, isqueiros, morroquianos, pomeranos, povos de montanha, retireiros do Araguaia, seringueiros, vazanteiros, andirobeiros, caatingueiros, jangadeiros, marisqueiras, pescadores artesanais de águas interiores, vacarianos, apanhadores(as) de flores sempre-vivas, veredeiros, groteiros-chapadeiros, povos já reconhecidos pelo Decreto nº 6.040/2007 e que integram a rica diversidade socioambiental brasileira.
Vale citar que a articulação dos dois Ministérios que resultou na Portaria Interministerial n. 1.309/2025, criando o Programa Territórios da Floresta, é uma política pública que trouxe avanços para o reconhecimento dos direitos territoriais de PCTs e que deve ser ajustada, complementada, fortalecida e ampliada. A articulação dos dois Ministérios, dos movimentos sociais de povos e comunidades tradicionais e das organizações da sociedade civil demonstra a importância do tema. Entretanto, esse avanço não é suficiente para abarcar as diversas realidades dos PCTs, sobretudo, daqueles que estão fora da Amazônia Legal.
Reconhecemos os esforços realizados por ambas as pastas — com destaque para a atuação da SETEQ/MDA e do CNPCT — e também os avanços técnicos representados na proposta de decreto elaborada por meio de consultoria com apoio da sociedade civil e representações de povos e comunidades tradicionais. Contudo, é notório que o processo político de construção do normativo não tem sido conduzido com a urgência, a transparência e a participação que o tema exige, especialmente diante da meta, hoje comprometida, de lançamento do decreto até a COP 30, em Belém do Pará.
É grave que ainda não tenhamos clareza sobre o cronograma de deliberação da proposta, sobre os compromissos concretos entre os ministérios diretamente envolvidos (MMA e MDA), e, sobretudo, sobre a estratégia de diálogo estruturado com as representações dos PCTs em nível nacional e regional.
A ausência de uma coordenação política clara e resolutiva entre os ministérios enfraquece a institucionalidade da pauta e alimenta o risco de retrocessos, sobretudo considerando o contexto de pressão fundiária, conflitos territoriais e desmonte de políticas públicas voltadas a esses povos nos últimos anos.
Diante disso, solicitamos formalmente uma audiência conjunta com Vossas Excelências, em caráter de urgência, com o objetivo de:
- Apresentar as preocupações, propostas e posicionamentos das representações dos PCTs e da sociedade civil organizada sobre o texto da minuta de decreto;
- Discutir um cronograma público e vinculante para os próximos passos da tramitação da proposta;
- Definir mecanismos claros de consulta e pactuação com os povos e comunidades tradicionais, em conformidade com a Convenção 169 da OIT e com os princípios da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (Decreto 6.040/2007);
- Estabelecer os compromissos interministeriais para viabilizar a assinatura do decreto ainda no atual governo, tendo como indicativo a COP 30, garantindo sua efetividade e implementação;
- Garantir a realização dos seminários regionais sobre regularização fundiária de Povos e Comunidades Tradicionais que ainda faltam nas regiões Sudeste, Centro Oeste e Sul.
Reafirmamos que a construção desse marco normativo não é apenas uma demanda histórica dos PCTs, mas também um passo fundamental para o combate à grilagem de terra, do latifúndio, do agronegócio e nos faz chegar mais perto do cumprimento dos compromissos internacionais do Brasil com a proteção da biodiversidade, com o enfrentamento às mudanças climáticas e com a promoção da justiça socioambiental.
A regularização dos territórios tradicionais é um imperativo democrático e um ato de reparação histórica. O tempo urge.
Atenciosamente,”
Em tempo: ESPERAMOS RESPOSTA POSITIVA URGENTE DA MINISTRA MARINA SILVA E DO MINISTRO PAULO TEIXEIRA.
Obs.: Em PDF, a Carta Aberta à Ministra Marina Silva e ao Ministro Paulo Teixeira, COM CENTENAS DE ASSINATURAS, segue na versão integral em anexo, abaixo.
Carta Aberta MDA e MMA – 29-04-2025.