Comunidades quilombolas de Belo Vale, MG, exigem paralisação de mineração que está violentando seus direitos. Há quilombolas entre os desaparecidos pelo crime da VALE e do Estado. Nota pública.


Comunidades quilombolas de Belo Vale, MG, exigem paralisação de mineração que está violentando seus direitos. Há quilombolas entre os desaparecidos pelo crime da VALE e do Estado. Nota pública.

Entrada da Comunidade Quilombola Chacrinha dos Pretos, no município de Belo Vale, MG. Fotos: A. Baeta.

As Comunidades Quilombolas Chacrinha dos Pretos e Boa Morte, no município de Belo Vale, MG, próximo a Congonhas, estão sob grande tensão, pois se situam abaixo, ou a jusante, de várias barragens de mineração que podem se romper a qualquer momento. Há ainda outras COMUNIDADES QUILOMBOLAS na região do Alto Paraopeba que também estão expostas a esta gravíssima situação, tais como: Tartária, Casinhas, Machados e Bananal, no município de Jeceaba;  Taquaraçu e Coqueiros, no município de Moeda; Marinhos, Rodrigues, Ribeirão, Sapé e Córrego do Feijão, no município de Brumadinho. Dois trabalhadores da Comunidade Quilombola Marinhos estão entre os desaparecidos do crime da Vale e do Estado: Geraldo Medeiros e Júnior Braga. Segundo listagem do CEDEFES (Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva), de 2008, muitas destas comunidades se encontram somente listadas ou identificadas, como é o caso da Comunidade Quilombola do Córrego do Feijão (golpeada pelo crime tragédia da Vale e do Estado), e algumas, por sua vez, já são certificadas pela Fundação Palmares. Todavia, independente da situação processual, faz-se necessária atenção emergencial também para estas Comunidades Quilombolas no contexto do crime tragédia iniciado por volta do meio dia, do dia 25 de janeiro de 2019, que se tornou uma grande sexta-feira da paixão que irá durar por muito tempo.

Abaixo, segue Nota redigida por lideranças da Comunidade Quilombola Chacrinha dos Pretos, de Belo Vale. 

Nós, do Quilombo Chacrinha dos Pretos, em Belo Vale, Minas Gerais, com mais de 60 famílias, embora não estejamos embaixo da lama tóxica do crime tragédia da Vale e do Estado, como muitas famílias de Brumadinho e de outros municípios, já estamos sofrendo as consequências do rompimento das quatro barragens da Mina de Córrego do Feijão. Dois familiares da nossa comunidade quilombola Chacrinha dos Pretos estão entre os desaparecidos do crime da Vale, com autorização do Estado. A nossa comunidade quilombola está ao lado do rio Paraopeba, que passa já muito contaminado na nossa comunidade antes de chegar a Brumadinho. Um grande número de peixes mortos está aparecendo com a contaminação do rio pelos rejeitos tóxicos de várias barragens. Nós somos testemunhas de que o rio Paraopeba não começou a ser morto no dia 25 de janeiro de 2019, com o genocídio da Vale, com licença do Estado, mas o Rio Paraopeba já vem sendo matado há muito tempo e lentamente pelos grandes projetos de mineração na nossa região. Nosso quilombo fica às margens do rio Paraopeba e estamos alarmados com a tragédia ocorrida em Brumadinho, porque também estamos abaixo da maior barragem de rejeitos de lama tóxica de mineração em área urbana da América Latina, a barragem Casa de Pedra, que fica na cidade de Congonhas, e tem capacidade para cerca de 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos tóxicos, quatro vezes mais do que a barragem da Mina Córrego do Feijão. 

Gravíssimo é que a barragem Casa de Pedra está em pleno funcionamento e a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) está exigindo a renovação da licença do Governo de Minas Gerais para o alteamento da barragem, para que seja ampliada ainda mais sua capacidade destruidora. Os vereadores do município de Congonhas já entraram com um pedido na Promotoria de Justiça do Ministério Público da Comarca de Congonhas solicitando a interrupção imediata das atividades da Barragem e sua transformação em rejeitos sólidos, barragem a seco. Em caso de rompimento, esta barragem devastará diretamente cerca de 5 mil pessoas, que se situam em apenas um bairro localizado na sede do Município de Congonhas,  além de incontáveis povoados e comunidades de Congonhas e de Jeceaba, como também as comunidades quilombolas Chacrinha dos Pretos e Boa Morte, ambas no município de Belo Vale. Embora esta barragem não esteja na lista das cinco barragens mais vulneráveis do estado de Minas, não temos nenhuma segurança com seu funcionamento, já que nem a Barragem do Fundão (Mariana) e nem a da Mina do Córrego do Feijão estavam nesta lista de barragens com risco de rompimento. Entretanto, ambas romperam causando tragédias sociais e ambientais gigantescas.

Na nossa Comunidade Quilombola Chacrinha dos Pretos, há um sítio arqueológico, lugar sagrado para nós, que está passando pelo processo de tombamento de suas ruínas, com registro de seus bens imateriais junto ao município de Belo Vale por possuir um enorme valor histórico, e, assim, passará a fazer parte do patrimônio histórico, cultural e religioso de Belo Vale. Por isso, exigimos a interrupção imediata das atividades de mineração na barragem Casa da Pedra, da mineradora CSN, em Congonhas, e das demais  barragens da Vale que estão no alto da Serra dos Mascates, onde também se situam cachoeiras e as belíssimas ruínas arqueológicas de Casas Velhas, mais um importante sítio marcado pelo trabalho e pela força dos negros escravizados da região. Exigimos que sejam revistos imediatamente os métodos superados, imorais e inadmissíveis que se usam no tratamento de rejeitos da mineração. Precisamos de soluções imediatas para evitar novas tragédias, que podem se estender progressivamente, destruindo ainda mais muitas e muitas vidas, além do magnífico patrimônio cultural e ambiental do nosso estado. Assina esta Nota: Associação Comunitária Chacrinha (ACC).”

Diante do exposto acima, conclamamos para o engajamento em lutas coletivas e sociais todas as Comunidades Quilombolas e Pesqueiras da bacia do Rio Paraopeba, comunidades ribeirinhas, agricultores familiares e povos das cidades de Minas Gerais e do Brasil. Ninguém pode se omitir e nem se contentar com medidas paliativas que não desarmam as bombas relógios – centenas de megabarragens que podem se romper a qualquer momento – que estão na cabeça de milhões de pessoas, da mãe terra, dos irmãos rios, de todos os seres vivos e das próximas gerações, inclusive. É necessário e ético frearmos esse modelo satânico profundamente devastador de mineração, antes que seja tarde demais. Basta de mineração devastadora! Basta de idolatria do mercado e do capital!

Assinam esta Nota:

Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES);

Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG);

Federação Quilombola do Estado de Minas Gerais N’golo;

Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos do estado de Minas Gerais.

Belo Horizonte, MG, 02 de fevereiro de 2019.

Entrada da Comunidade Quilombola Boa Morte, no município de Belo Vale, MG.
Praça e cruzeiro na Comunidade Quilombola Boa Morte.
Praça, cruzeiro e Igrejinha na Comunidade Quilombola Boa Morte.
Tuquinha, liderança quilombola do Quilombo Chacrinha dos Pretos, sendo entrevistada dia 31/01/2019, por frei Gilvander, da CPT.